Leonardo Arruda
leonardoaugusto.info@gmail.com
http://lattes.cnpq.br/1593717382092364
No dia 3
(três), 4 (quatro) e 5 (cinco) de abril de 2023, participei das festividades de
comemoração dos 40 anos do NICS, onde tenho realizado a minha pesquisa de
mestrado, principalmente no que se refere as aplicabilidades da linguagem
visual de programação Pure Data em projetos envolvendo música e tecnologia.
Neste ambiente, tive a oportunidade de conhecer pesquisadores e professores
profissionais da área da musicologia sistemática e etnomusicologia, além do
convívio com outros doutorandos e mestrandos que também executam suas pesquisas
no ambiente do NICS.
O Núcleo
Interdisciplinar de Comunicação Sonora ou NICS faz parte dos 21 centros e
núcleos interdisciplinares de pesquisa da Unicamp[2].
O NICS foi fundado em 8 de abril de 1983, através da portaria GR 101/83, pelo
Prof. Dr. Raul do Valle e outros, com a proposta inicial de estimular a
pesquisa científica e artística que abrange as diversas formas de manifestações
sonoras. No começo de suas atividades, o NICS focou em pesquisas na grande área
de comunicação sonora, tais como pesquisas sobre poluição sonora, análise dos
cantos de animais, fonética, música eletroacústica e registros
etnomusicológicos. Hoje em dia, as pesquisas realizadas no NICS abrangem temas
como análise de práticas musicais e estudos da arte sonora; ambientes
interativos e interfaces em música estendida; cognição, comunicação sonora e
diversidade (por exemplo minha pesquisa envolve o estudo da música e a surdez
usando ferramentas computacionais, além de outras pesquisas no segmento da música
nos games, paisagens sonoras, etc.), além de análise, síntese e percepção da
cena sonora[3].
Em 2023, o NICS celebrou seu 40º aniversário com um evento de três dias, cada
um com uma atividade diferente. No primeiro dia, houve a instalação do projeto
"NI(n)CS", produzido por Dr. José Fornari[4].
No segundo dia, o fundador do NICS, o Prof. Dr. Raul do Valle, e os primeiros
participantes e coordenadores do núcleo, Prof. Dr. Adolfo Maia e Prof. Dr.
Jônatas Manzolli, foram convidados para falar sobre seus percursos no NICS, os
desafios enfrentados e a criação de um campo de pesquisa interdisciplinar
inovador. Para encerrar o evento com chave de ouro, o Ensemble Eletroacústicos
NICS, composto pelo pesquisador, Dr. Manuel Falleiros [5](sopros
e processamento digital), Prof. Dr. André Martins [6](guitarra,
bandolim e processamento digital) e Bruno Trochmann (cordas e instrumentos
preparados), realizou uma performance da obra "O Tratado" de
Cornelius Cardew, utilizando suas experiências como improvisadores especializados
na linguagem da música aberta e em tempo real. Comentaremos sobre cada dia do
evento nos próximos parágrafos.
Para marcar o
início das comemorações dos 40 anos do NICS, uma exposição foi realizada na
entrada da Biblioteca Central da Unicamp, apresentando o modelo computacional
"NI(n)CS", desenvolvido pelo Pq. Dr. José Fornari em Pure Data[7].
Este modelo executa uma performance musical computacional autônoma da obra
"In C" de 1964, do compositor norte-americano Terry Riley. A obra
consiste em 53 pequenos fragmentos musicais originalmente executados por
humanos e é recomendada pelo compositor para ser tocada por 35 músicos que
escolhem espontaneamente quais fragmentos desejam tocar.
O projeto "NI(n)CS" é baseado em uma pesquisa
descrita no artigo "Playing Algorithms:
Finite State Machines with Datapath in Music-Domain Visual Languages" (TAVARES; FORNARI,
2023). Este é constituído por um patch principal que consiste em 35 subpatches,
cada um chamado "musician",
que executa um ciclo completo do caminho de dados (datapath) de uma FSM (Finite State Machine ou máquina de
estados finitos) que escolhe, a cada mudança de estado, um trecho musical da
obra "In C".
Para compreender o funcionamento básico das Finite State
Machines (FSM), é possível compará-las às Cadeias de Markov (XENAKIS, 1963), já
que ambas executam operações que mapeiam estados em eventos discretos. No
entanto, no caso da FSM, o algoritmo é determinístico, permitindo que um
caminho mapeado seja percorrido apenas por uma única via, variando somente em
duração e possibilitando a criação de variações de acordo com as alterações dos
parâmetros no algoritmo (TAVARES E FORNARI, 2023). Então, por exemplo, as
variáveis internas do FSM podem ser mapeadas e permitir controlar elementos
contínuos como ganhos, filtros e o timbre do áudio.
Segundo
Tavares e Fornari (2023), descrevem o FSM usado como um modelo computacional
que possui um número finito de estados, sendo ativado apenas um por vez a cada
ciclo. Normalmente, as FSM possuem 5 estados, sendo 0 (zero) o primeiro e 4
(cinco) o último. A cada ciclo, uma FSM pula de um estado para o outro, por
exemplo: 0, 1, 3, 2, 1, 2, 1, 0, 3, 2, 3, 2,..., 2, 3, 4. Quando chega no
último estado (4) a FSM para de funcionar. Para conseguir fazer o patch tocar
as 53 partes da composição de Terry, foi criado um acumulador em que as
mudanças são cumulativas, ou seja, sempre somam. Dessa forma, no exemplo
anterior, teria-se o seguinte: 0, 1, (3+1)=4, (2+4)=6, (1+6)=7, (2+7)=9… etc. e
assim que passar de 53, o acumulador é zerado. Essas acumulações e contagem da
mudança de estados, acontecem até o FSM atingir o seu último estado, que é 4
(quatro). Portanto, cada “musician” toca uma sequência de trechos que segue do
1 (um) até o 53 (cinquenta e três). O próprio artigo de Tavares e Fornari
(2023) apresenta um bloco de operações de uma FSM como exemplo.
Blocos funcionais de uma FSM
Fonte: https://www.preprints.org/manuscript/202303.0182/v1
Segundo
Tavares e Fornari (2023), cada um dos “musician” executa o patch da FSM. Cada
um dos 35 musicians é iniciado
sequencialmente, após 7 segundos do início do musician anterior. O tempo que cada “musician” toca é indeterminado, pois depende do caminho definido
pela sequência de estados do algoritmo FSM de cada um dos outros “musician”. Quando cada “musician” atinge seu último estado, sua
execução é suspensa. Cada trecho escolhido é executado pelo menos 4 vezes. Além
disso, cada “musician” é programado
para ter uma localização espacial ligeiramente diferente, a fim de proporcionar
a sensação de se estar ouvindo um grupo musical. Tavares e Fornari (2023)
complementam que as performances começam com um primeiro trecho definido, mas a
escolha dos caminhos a serem percorridos é aleatória e sempre nova, o que está
de acordo com a releitura computacional desta obra relacionada ao minimalismo.
Abaixo, encontram-se algumas imagens do projeto "NI(n)CS" e um vídeo
dele sendo executado.
No próximo blog, postarei sobre o segundo dia do evento que contou com os primeiros coordenadores do NICS e com a presença do fundador, o Prof. Dr. Raul do Valle.
Patch NI(n)CS dos pesquisadores Dr. Tiago Tavares e Dr. José Fornari.
Fonte: https://www.nics.unicamp.br/nics40anos/
Patch NI(n)CS dos pesquisadores Dr. Tiago Tavares e Dr. José Fornari sendo executado.
Fonte: https://www.nics.unicamp.br/nics40anos/
Referências bibliográficas
XENAKIS, Iannis. Formalized Music:
Thoughts in Mathematics and Composition. New York: Pendragon Press, 1963.
TAVARES, T.; FORNARI, J. E. Playing
Algorithms: Finite State Machines with Datapath in Music-Domain Visual
Languages. Preprints.org
2023, 2023030182. https://doi.org/10.20944/preprints202303.0182.v1.
[1] https://www.nics.unicamp.br/nics40anos
[2] https://www.cocen.unicamp.br/centros-e-nucleos
[3] https://www.nics.unicamp.br/pesquisa/
[4] https://www.nics.unicamp.br/nics40anos/
[5] https://manufalleiros.com/en/
[6] https://www.andremartins.online/
[7] Pure data. Disponível em: https://puredata.info/
Como referenciar este artigo:
ARRUDA, Leonardo. NICS: 40 Anos de Comunicação Sonora (Parte 1) - Instalação Sonora "NI(n)CS" por Dr. José Fornari. Blog C4, Campinas, NICS; UNICAMP, 03 maio 2023. ISSN: 2764-5754. Disponível em: <https://unicampc4.blogspot.com/2023/05/nics-40-anos-de-comunicacao-sonora.html>